Shae Collins. Foto: site Xojane |
Os debates dos posicionamentos do feminismo com relação à sexualidade têm
seus pontos mais populares: violência sexual, prostituição e ainda a prática da
libertação sexual. Neste último, temos uma das questões: “quão libertas ou
castas podemos ser, afirmando que esta decisão não é o patriarcado que a está
direcionando?”. O texto fomenta uma reflexão sobre ser virgem e ser
feminista, através do relato de uma jovem de 22 anos. (Carolina Ferreira)
Por Shae Collins
Alguns meses
atrás, minhas amigas estavam ao redor de uma mesa falando sobre os lugares mais
bizarros em que já fizeram sexo. Quando chegou na minha vez, seus queixos
caíram com minha resposta. Então, alguém soltou um suave “Awww”, — do tipo que você faz para um bebê, logo
depois que ele solta um arroto. Foi a primeira vez que eu admiti para um grupo
de feministas que eu era virgem — algo do qual eu tive vergonha por um tempo.
Eu não sou
religiosa, não tenho medo de sexo e tenho um namorado incrível há 2 anos, que
estaria na minha porta em segundos com uma caixa de preservativos se eu fizesse
aquela ligação convocando-o. Além de tudo isso, de vez em quando escrevo para
um site sobre sexo chamado ‘Slutist’. Mas, apesar de todos esses
fatores, eu sou uma virgem de 22 anos.
Eu sei que 22
anos não significa ser muito velha. Porém, em um país em que a média de idade
da perda da virgindade é aos 17 anos, onde adolescentes estão fazendo sexo em
programas populares da TV (eu tenho certeza que daqui a alguns anos, até mesmo
personagens do canal Disney Channel estarão fazendo sexo), e as feministas têm
trabalhado incansavelmente para incentivar jovens mulheres a abraçarem sua
sexualidade, 22 anos parece um pouco fim de jogo. Meus poucos amigos virgens e
eu somos vistos como os esquisitos.
A maioria das
pessoas não entende isso — nem mesmo minha própria mãe, que está começando a se
perguntar se algo está psicologicamente errado comigo.
O que minha mãe
e meus amigos não sabem é que, assim como eles, eu também não entendo porque
não estou fazendo sexo.
“Sim, eu me
sinto fisicamente atraída por ele”, expliquei a um dos meus melhores amigos no
telefone quando precisei de algum conselho sobre o assunto. “Sim, nós damos
amassos — mas não muito mais que isso. Sim, eu tenho certeza que ele é o cara
com quem quero estar. Sim, um dia eu vou fazer sexo com ele, mas eu só não sei
quando”.
Minha condição
de feminista aumenta minha vergonha de ser virgem. No reino feminista a virgindade
é frequentemente associada com “o patriarcado”. É uma das metades do binarismo
sexista que envergonha as mulheres. Virgens não ganham muito amor ou atenção em
círculos feministas, onde tantas mulheres lutaram pelo direito de serem
descaradamente sexuais. Feministas têm sites dedicados a preferências e
fantasias sexuais, defendemos que tudo se resume ao direito da mulher de ter
controle sobre seu corpo e algumas de nós tem orgulho em se denominar putas ou
vadias.
Entre minhas
colegas e amigas feministas sexo parece ser a norma. E, já que eu não estou
fazendo, comecei a me perguntar o que diabos havia de errado comigo. Por que
não sou sexualmente liberal como todo mundo? Eu tinha vergonha por ainda não
ter abraçado a minha sexualidade. Então, eu tentei me apressar para estar
pronta para o sexo.
Eu olhei para o
meu passado para explicar a minha condição de virgem, questionando se as muito
frequentes conversas sexuais com minha mãe estavam ou não na raiz do problema.
Minha mãe seguiu uma linha ‘tradicional” em seu estilo de criação e usou uma
tática de 2 passos ao falar sobre sexo: assuste e repita. Ela, constantemente,
me questionava se eu estava fazendo sexo ou não e sempre me lembrava das
consequências.
“É melhor não
trazer bebês para casa”, dizia minha mãe, de uma maneira em parte jocosa, mas
obviamente séria. As conversas tornaram-se mais frequentes depois que fui pega
beijando um menino na 8ª série. Minha mãe ficou, evidentemente, chocada. Minha
reputação de boa moça foi contaminada e eu não conseguia olhar nos olhos de
minha mãe. Ela me colocou de castigo por 3 meses, mas eu carreguei a humilhação
por bem mais tempo.
Então, eu, assim
como muitas meninas com educações rígidas, cresci associando sexo com vergonha,
gravidez indesejada e doenças sexualmente transmissíveis.
Porém, me
prender ao meu “problema da virgindade” na minha infância não respondeu minhas
perguntas, nem me fez querer sair e ter relações sexuais. Então, comecei a
procurar maneiras de me “libertar sexualmente”. Escrevi artigos para jornais
com títulos como “Onde está a minha agência sexual?” e “Meu monólogo pessoal da
vagina”.
Eu considerava a
assexualidade como uma possibilidade, porque eu raramente tenho o desejo físico
de fazer sexo, mas não tinha certeza. Pesquisar sobre o tema gerou novos
temores e perguntas: sou assexuada? Como eu poderia saber se sou assexuada
sendo que nunca tentei ter relações sexuais? Se eu sou, meu namorado ou
quaisquer futuros parceiros aceitariam isso?
O absurdo girou
na minha cabeça e consumiu meus pensamentos durante meses, até que um dia me
deu um estalo. Minha voz interior falou para mim como se eu fosse uma criança
estúpida: “Shae, mande tudo pro inferno! Se você não está pronta, então você
não está pronta. Por que a pressa?”. (Minha voz interior tem um jeito bem
agressivo).
Por todas as
horas em que eu tinha gasto escrevendo, pesquisando, lendo e pensando sobre a
minha sexualidade, eu não estava disposta a aceitar uma explicação tão simples.
Mas, eu finalmente percebi que estava jogando o jogo de outra pessoa. Assim
como minha mãe, professores e mentores me ensinaram a não permitir que os
meninos me pressionassem a fazer sexo quando eu estava na escola, eu tinha que
me ensinar novamente a não permitir que as idéias de outras pessoas sobre sexualidade
ditassem minha vida sexual.
Eu tenho que
constantemente me lembrar que não há nada de errado comigo ou com qualquer
outra pessoa que não está fazendo sexo, seja por razões espirituais, histórias
traumáticas ou falta de interesse. Eu tinha que perceber que o que é
sexualmente “apropriado” ou normal para uma pessoa não significa
necessariamente que funciona para todas.
Resumindo: eu
não estou pronta. Não há necessidade de vir com alguma desculpa esfarrapada
sobre minha infância quando as pessoas perguntam por que eu ainda sou virgem.
Não há necessidade de tentar me forçar a fazer algo que eu não quero. E não há
necessidade de tentar ser normal.
Sou uma virgem
de 22 anos de idade e eu estou bem com isso.
Publicado
originalmente com o título: ‘I shouldn’t need an excuse to be a virgin' no site Xojane.com 10/03/2014.
Republicado por Blogueiras Feministas (Eu não devia precisar de uma desculpa para ser virgem), em 29/07/2014.
A autora
Shae Collins mora
em Los Angeles. É escritora freelancer e criadora do blog A Womyn´s Worth, onde escreve sobre raça, gênero e cultura pop
com foco nas mulheres negras.
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