terça-feira, 17 de junho de 2014

Breve história de Maria Greyci

Eu era várias - por: Luís Marques
Vários. Vários. Sabiamente vários. Pausas de Maria Greyci. Depois de sair da vagina de minha mãe, rotularam-me com um conjunto de letras às quais disseram ser meu nome. Em seguida, vestiram-me de roupas rosas com estampas florais e delicadas. Ninguém podia perguntar se era aquilo que queria usar. Mas eu também gostava de outras cores, o rosa não me agradava tanto. Preto e roxo davam-me uma certa paz. Ninguém podia perguntar se era aquilo que queria usar.

Restritos. Restritos. Sabiamente restritos. Escolhas de Maria Greyci. Quando fiz doze anos tive vontade de usar cuecas. Meus pais me olharam com desaprovação, achavam que aquilo era sinal de que gostava de mulheres. Continuava a gostar de homens. Ali nossa distância começava a tomar formas mais explícitas. Parei de usar cuecas, aprendi a gostar de calcinhas. Segui, não chorei diante da restrição deles, segui os amando, embora também amasse cuecas.

Sessenta anos. Seis anos. Ambos morreram, passei a cortar o cabelo rente às têmporas. Não me arrependo da vida que tive, gostava dos pelos que brotavam de meu peito e de minhas axilas, fiz aulas de ballet por vinte anos, passei a usar cuecas. Vontade própria. Sim, fui várias. Aval que a morte nos concede. Segui remando, solitária e variada.
Luís Marques.

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